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Foto do escritorGabriel Veras

Raio-X: Jornalismo e consciência ambiental andam de mãos dadas

Atualizado: 14 de dez. de 2020


O debate sobre a questão ambiental no Brasil era muito reservado até o início da década de 1990, quando foi anunciado que o Rio de Janeiro sediaria a Conferência das Nações Unidas para o Clima, a Rio 92. O evento, que reuniu as principais lideranças mundiais, logo ganhou as manchetes dos maiores noticiários brasileiros.


O interesse da mídia colocou o debate ambiental nas rodas de conversa. A cobertura jornalística sobre o meio ambiente nos anos 1990 foi fundamental para que a ecologia ganhasse espaço no cenário político nacional.


Pesquisas mostraram que conforme o meio ambiente ganhava destaque no noticiário, ganhava também importância no cotidiano dos brasileiros. Como diz o título desse artigo, jornalismo e consciência ambiental andam de mãos dadas. E, com boa vontade da mídia, essa discussão foi se ampliando.


Até que a sociedade brasileira — e mundial — viu surgir um movimento de desconfiança com a mídia tradicional e o estabelecimento de “fatos alternativos”, que evidenciaram um brasil paralelo, conservador e extremo.


Nesse contexto de pós-verdade, que não é bem uma novidade, mas que ganhou uma expressividade assustadora com o crescimento da desinformação nas mídias digitais.



O Brasil sempre foi um país agressivo com os defensores do meio ambiente. Nossa história recente nos mostra isso, com exemplos como o de Chico Mendes, irmã Dorothy ou até mesmo o processo de desconstrução da imagem da pequena Greta Thunberg.


O que nos restava era o apoio popular. E é justamente na opinião pública que a pós-verdade atua e amplifica uma falsa dicotomia entre sustentabilidade e desenvolvimento.


Segundo pesquisa do Ibope encomendada pela Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais (Renctas), apesar de cerca de 70% dos brasileiros acreditarem que nosso país não respeita o meio ambiente, apenas 30% confiam no trabalho das organizações ambientais.


Esse cenário de desconstrução da opinião pública em relação ao meio ambiente, aliado ao desmonte das políticas públicas, torna ainda mais importante — e urgente! — uma abordagem mais consciente da mídia nas pautas ambientais.


A questão ambiental é uma questão humana


Como bem ressaltou o jornalista Vilmar Berna em um artigo para o Observatório da Imprensa, a informação ambiental de qualidade e em quantidade suficiente é ferramenta indispensável para a formação e mobilização da cidadania ambiental.


Nós somos seres essencialmente ambientais. Há, portanto, uma relação forte e direta entre as pautas ambientais e nossa vida cotidiana. O desmatamento na Amazônia, por exemplo, afeta diretamente o clima na cidade grande.


Da mesma forma, a história da queimada florestal é também a história dos povos indígenas que não têm seu território respeitado ou a história do pequeno produtor que perdeu sua colheita e que não vai conseguir abastecer o mercado local.


Estabelecer essa relação entre a questão ambiental, que muitas vezes é vista como um problema distante, pode ser uma estratégia interessante para humanizar a pauta e, assim, criar um elo com o dia a dia do público.


Nossa abordagem precisa ser didática

O teórico José Luiz Braga, no livro A sociedade enfrenta sua mídia, fala que grande parte do conhecimento e da experiência dos públicos no que se refere a assuntos ambientais passa necessariamente pelo enquadramento midiático.


Provavelmente, as primeiras discussões ambientais nas quais nos vimos inseridas foram provocadas pelos aparelhos midiáticos. Nesse sentido, a mídia é educadora e, assim sendo, precisamos ser didáticos na abordagem dessas pautas.


A imprensa traduz e forma as percepções que as pessoas não enfrentam diretamente. O jornalismo precisa ser entendido como um ator socioambiental e, dessa forma, pensar e repensar a forma de comunicar o meio ambiente.


Nosso fazer jornalístico, para além do jornalismo ambiental, precisa ser claro, transparente e direto. É necessária honestidade intelectual no processo de produção midiática e ousadia para ir além do factual.


É importante, claro, compreender o meio ambiente como um tema transversal. Talvez seja uma boa ideia deixar de lado o juridiquês, o politiquês e falar o bom e velho português.


Encontrando espaço para novos formatos


A internet virou a casa da pós-verdade, com ampla divulgação de desinformação em websites, perfis em redes sociais e aplicativos de mensagens. Nessa rede, há espaço para os mais diferentes formatos de texto, imagens e vídeos.

O jornalismo formal, por outro lado, parece engessado nos formatos tradicionais. Isso não é de todo ruim. O jornalismo precisa se distanciar dessa onda de informação mal estabelecida nessa infinidade de blogs, portais e perfis de comunicadores alternativos.

No entanto, não podemos nos privar de inovar e de experimentar entregar nossa mensagem, que precisa passar por todas as etapas de apuração, em novos formatos.

É urgente que nós tomemos posse das novas linguagens que se estabelecem na rede e que são cada vez mais familiares aos milhões de brasileiros.

Dados da última pesquisa Digital News Report, uma parceira entre o Reuters Institute e a Universidade de Oxford, revelaram que o brasileiro se informa pelo Facebook (54%) e pelo WhatsApp (53%). Ao mesmo tempo, o principal jornal do país, a Folha de São Paulo, se retirou do Facebook.

É o momento de repensarmos como anda nossa relação com as redes sociais. É difícil, sim, lutar contra a cada vez maior rede de desinformação. Mas precisamos acompanhar a forma com que o brasileiro se informa. Precisamos estar presentes nesses canais, nesses formatos.

 

O jornalismo está sob ataque. O meio ambiente está sob ataque. É hora de pensar: se a estratégia que temos adotado não está surgindo efeito, o que vamos fazer?

Não é o momento de abandonar nossa profissão. É possível reverter o quadro de descrédito pelo qual passamos e, mais uma vez, ter a opinião pública como aliada. Não é uma tarefa fácil e é para isso que abrimos esse espaço de debate.

É imperativo falar sobre o jornalismo. Por isso, a Abaré acredita que a revolução do jornalismo passa, necessariamente, pela discussão do fazer jornalístico. Vem com a gente?

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