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Câmara mantém suspensa norma que define debate de gênero nas escolas de Manaus

Por Jullie Pereira e Klauson Dutra

Foto: Altemar Alcântara/Prefeitura de Manaus

Mesmo após decisão judicial, a Câmara Municipal de Manaus (CMM) mantém suspensa a resolução do Conselho Municipal de Educação (CME) que garantiu o debate de gênero nas escolas da rede municipal da cidade.


A Resolução 091/2020 foi publicada em Diário Oficial no dia 13 de janeiro de 2021. Nela, o CME define orientações para que as escolas incluam em seus projetos político-pedagógicos os temas de diversidade religiosa, sexual, de gênero e de relações étnico-raciais.


O conselho afirma que o objetivo da resolução é o respeito ao ser humano e o reconhecimento da identidade. E diz ainda que a ideia não é promover “ideologias ou interferir nos valores pessoais”, mas garantir a convivência social, independente das diferenças.


Para o professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), doutorando em Filosofia da Educação, Alvaro Sanches, para aplicar temas como esse em sala de aula, é preciso montar uma diretriz educacional para tratar sobre os temas em sala de aula.

“É claro que nós não teremos uma opinião única sobre isso, mas ter diretrizes claras é importante para que os professores possam, dentro de sala de aula, abordar o tema de forma responsável”, disse.

Vai e volta


Posteriormente, o CME publicou outra resolução, no dia 16 de março, suspendendo os efeitos da 91/2020, sob alegação de que deveria haver um debate maior sobre o tema, com a participação do legislativo.


Menos de uma semana depois, no dia 22 de março, o juiz Cássio André Borges dos Santos, do TJ-AM, determinou que a nova resolução fosse suspensa, mantendo a original, que previa o debate da raça e gênero nas escolas.


No dia 14 de junho, o Diário Oficial da Câmara Municipal publicou o Decreto Legislativo nº 527, suspendendo novamente a Resolução 91/2020, sem justificativas. Procurado, o presidente David Reis, que assina o decreto, não retornou a reportagem.


O presidente do CME, Thiago Silva, se limitou a dizer que a resolução será debatida novamente entre os conselheiros.

Debate expandido


Para o professor Jonas Araújo, que dá aulas de História em escolas de Manaus, a suspensão da medida revela o pensamento conservador dos vereadores.


Ele conta que, mesmo sem a resolução, tenta abordar os temas nas aulas para estudantes do 8º e 9º ano e também aos alunos do Ensino de Jovens e Adultos (EJA).

“Eu trago essas temáticas na perspectiva da alfabetização científica para poder elevar o senso crítico, ampliar os horizontes, tanto dos estudantes quanto dos professores também”, disse.

Nas experiências com os alunos, Araújo relata que todos eles recebem os assuntos de forma tranquila. “Os estudantes interagem com essas temáticas de forma completamente diferente desse medo que muitos políticos têm", explica.


O professor e pedagogo Nilton Carlos ratifica a importância de trazer para o debate temas como racismo e religião para as salas de aula. Na avaliação dele, a história no Brasil e no Amazonas foi “embranquecida” e pouco se discute sobre a história e a presença da população negra no estado.


“É importante que desde a educação básica até sua formação final, na faculdade, a gente debata sobre esse e outros temas”, ressalta.


Perspectivas


Para Alvaro Sanches, a dificuldade em trabalhar com temas relacionados à sexualidade, religião e raciais está em entender a bagagem educacional que cada aluno e professor traz para as salas de aula.


Já para Nilton, que trabalha há cerca de 35 anos como pedagogo e pesquisador, a desinformação atrapalha o processo de debate sobre os temas nas escolas


O pedagogo cita a polarização política como outro empecilho para o debate de temas "sensíveis", como gênero e raça, nas sala de aula. Apesar disso, ele confia que a educação é a melhor saída para curar a ignorância


“Paulo Freire dizia que a educação não muda o mundo, a educação muda as pessoas, e as pessoas é que mudam o mundo. Então é nessa perspectiva que nós devemos seguir”, lembra.

 

Esta reportagem foi produzida com apoio do Laboratório Anticorrupção da Purpose Brasil e contou com o uso do Querido Diário, a ferramenta de abertura dos diários oficiais da Open Knowledge Brasil. A iniciativa reúne quatro coletivos de jornalismo independente de diferentes regiões do Brasil para difundir a importância das informações públicas contidas nos Diários Oficiais.

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